Eu vou falar do espetacular, único e sensacional livro Sísifo desce a Montanha, escrito por Affonso Romano de Sant'Anna e lançado pela Editora Rocco em 2011 e reúne alguns poemas do autor que, alguns deles, remetem à história da humanidade, como a batalha de Cartago que foi travada em 698 entre as forças expedicionárias bizantinas e os exércitos do Califado Omíada. Tendo perdido Cartago para os muçulmanos, o imperador bizantino Leôncio enviou a marinha sob o comando de João, o Patrício, e o drungário Tibério Apsímaro. Na mitologia grega, Sísifo, filho do rei Éolo, da Tessália, e Enarete, era considerado o mais astuto de todos os mortais. Foi o fundador e primeiro rei de Éfira, depois chamada Corinto, onde governou por diversos anos. Casou-se com Mérope, filha de Atlas, sendo pai de Glauco e avô de Belerofonte. Há um livro chamado O mito de Sísifo é um ensaio filosófico escrito por Albert Camus, em 1941. Para ele, o homem vive sua existência em busca de sua essência, do seu sentido, e encontra um mundo desconexo, ininteligível, guiados por entidades sufocantes como as religiões e ideologias políticas. A solução em não encontrar um sentido não deveria ser o suicídio, mas sim a revolta. Para quem não sabe, Sísifo, que é um mitônimo grego esubstantivo masculino e é a Pessoa que tem tarefa ou trabalho que implica um esforço rotineiro e interminável, não sendo produtivo. Recorrendo ao mito grego de Sísifo, aquele que conseguiu driblar o seu destino e aprisionar a morte, ousadia pela qual foi condenado ao exaustivo e inútil trabalho de rolar uma grande pedra de mármore ao topo de uma montanha, o poeta explicita o desejo de refletir sobre a passagem do tempo e a finitude. A epígrafe de Clarice Lispector expondo a urgência da "deseroização de si mesmo" fala do trabalho estético e existencial deste poeta. Nesta coletânea de poemas, Affonso Romano de Sant'Anna retoma temas de livros anteriores, como a história, viagens físicas e metafísicas e a convivência com animais. Dialogando com o mistério da vida, do tempo, do universo e da morte, o poeta, do alto de seus mais de 70 anos, e uma vivência que inclui as utopias dos anos 60, a experiência da sala de aula, gestões como a que promoveu na Biblioteca Nacional (1990-1996) e o exercício diário da palavra escrita e recitada em lugares como Alemanha, Irlanda e México, apresenta uma obra que desafia a ideia de aleatoriedade que uma coletânea pode conter. Tudo aqui é pensado, coeso, com a organicidade de quem pratica a coerência e sabe que tem a oferecer ao leitor um painel de rara maturidade estética e existencial. Sísifo desce a montanha é um livro cujo tema central é a morte – os medos, as angústias, os enigmas, as inquietações que rondam o assunto. O poema Véspera clarifica que não existe quem esteja preparado para a hora última, para a hora derradeira, que ninguém está à espera da morte, que ninguém está realmente pronto para o ponto final. No entanto, como pode (erroneamente) parecer, este não é um livro sobre a morte. Este é um livro sobre a vida, sobre o grande aprendizado que é viver, confirmando a máxima de que, até o último sopro de respiração, o ser humano é um eterno aprendiz. A finitude é uma das grandes questões da humanidade, senão a maior. Sísifo desce a montanha é um livro sobre a nossa breve existência neste mundo cheio de nuances, gradações e variantes.
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